bemquerer capa

 

Partia o coração de Oscar lembrar-se dos sofrimentos de Marlene.

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bemquerer capa capVIII

Marlene, desde a partida do marido para se esconder na fazenda do tio Juquita, estava desassossegada. A combinação era que ele telefonaria quando chegasse a Corinto.

− Fique calma, com essa confusão as ligações telefônicas não devem funcionar direito − dona Zezé tentava consolar a filha.

− Ele foi preso, mamãe, alguma coisa me diz que apanharam o Oscar antes de ele embarcar ou na estrada.

− Ele vai dar notícia, vamos esperar.

Oscar não apareceu na fazenda. Uma semana depois do combinado, tio Juquita foi a Corinto e telefonou para seu irmão. Seu Manoel, com a ajuda de seus amigos do Rotary Club, conseguiu a informação de que seu genro estava preso nas dependências do Departamento de Ordem Pública e Social. Tentou por todos os meios uma autorização para visitá-lo, mas foi impossível. Um amigo, com contatos no DOPS, garantiu que ele estava bem, mas não podia receber visita. Somente depois de obter essas informações é que seu Manoel deu a notícia à mulher e à filha.

− Pelo menos ele está vivo e sabemos onde está.

− Ele está sendo torturado, mamãe. Vou lá ao DOPS, tenho de vê-lo. Faço um escândalo se me impedirem.

− Aí você vai presa também.

− Eu prefiro estar com ele na cadeia do que aqui fora, sabendo que eles o estão maltratando.

Seu Manoel ponderou que qualquer atitude intempestiva poderia prejudicar a situação de Oscar.

− Vamos rezar minha filha, Deus vai proteger seu marido.

Foram à igreja de São Judas Tadeu onde Marlene fez a promessa de ajudar na construção do santuário, acendeu uma vela, rezou e voltou mais aliviada para casa.

Foi um tempo de aflição e sofrimento. Marlene pensava no marido o dia todo. Acordava esperando que ele lhe levasse um cafezinho na cama, como fazia todos os dias. A ausência do aroma lhe lembrava que ele devia estar numa cela fria, talvez ferido, sozinho e abandonado. Chorava desconsolada, verificava se a vela diante da imagem de São Judas continuava acesa e rezava até se sentir consolada.

Foi várias vezes ao DOPS, mas era impedida de chegar à portaria por policiais grosseiros. Um dia foi abordada por um policial, surpreendentemente cortês, que lhe perguntou o motivo de sua presença naquele local.

− Meu esposo está preso aqui. Oscar Pereira Lino. Preciso ter notícias dele.

− Ah, o Oscar do Sindieletro! Qual é sua graça, minha senhora?

− Marlene Silveira Lino. O senhor conhece o Oscar? Ele está bem?

− Hoje cedo ele estava muito bem disposto, dona Marlene.

O coração de Marlene disparou.

− Posso vê-lo?

− Infelizmente ele está incomunicável, mas eu posso levar um bilhete da senhora para ele.

Marlene tirou da bolsa um envelope e passou para o detetive.

− Me procure na Gruta Metrópole, às sete da noite, talvez eu consiga trazer uma resposta para a senhora.

− Eu estarei lá. Um bom dia para o senhor.

− Não quer saber o meu nome?

− Quero, qual é?

− Detetive Barbosa, seu criado, mas pode me chamar de Barbosinha.

− Até logo, seu Barbosa.

− Uma questão de segurança, não conte nada a ninguém. Estou me arriscando muito.

Marlene chegou à casa dos seus pais e dona Zezé notou que havia alguma coisa no ar.

− O que está acontecendo, minha filha?

− Nada, mamãe. Estive no DOPS, mas não consegui nem pisar no passeio, está tudo interditado.

− Você está diferente, me conta, teve alguma notícia?

− Não, mamãe, é cisma da senhora. Estou com fome. Tem almoço?

− Que novidade, tem quinze dias que é uma luta fazer você comer alguma coisa.

Após o almoço, dona Zezé viu a filha olhando o catálogo telefônico, anotando alguma coisa no bloco de recados e colocando na bolsa. Depois, ela foi para sua casa, dizendo que ia dormir um pouco.

Dona Zezé examinou o bloco e conseguiu ver a marca da anotação da filha: “Gruta Metrópole, Rua da Bahia, 1052”.

Marlene passou a tarde tentando resolver um dilema angustiante: ir ou não ir ao encontro com o detetive. Não lhe passara despercebido seu olhar guloso a lhe percorrer o corpo da cabeça aos pés. Mas era a primeira oportunidade de receber alguma notícia concreta de Oscar. Rezou para Nossa Senhora das Graças, que ela tantas vezes coroara, na matriz da sua paróquia. Às dezoito horas, colocou um vestido bonito, mas discreto, e seguiu para o encontro.

Sua entrada no restaurante provocou um frisson. Sua beleza ruiva sempre despertara a admiração das pessoas. Avistou o detetive Barbosa numa mesa próxima da entrada, olhou discretamente em sua direção e continuou em frente, ocupando uma mesa mais ao fundo. Barbosinha estava jantando com alguns colegas. Eles olhavam para a mesa de Marlene e riam ruidosamente.

Marlene estava com as faces rubras de constrangimento. Seu desejo era sair correndo daquele lugar. Sentiu em seu ombro um toque familiar.

− Papai, o que o senhor está fazendo aqui?

− Eu que lhe pergunto, minha filha.

Marlene olhou instintivamente para a mesa onde estava o detetive.

− Quem são aqueles homens, Marlene?

− É o detetive Barbosa que prometeu me trazer notícias do Oscar.

− Oscar foi transferido para uma prisão do exército em Juiz de Fora, há três dias.

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Marlene sempre teve fé em si mesma e em Deus.

(Continua no próximo capítulo)